Depoimento de Kalmeron Tores

– 1º Colocado no concurso EsFCEx – Enfermagem

Meu nome é Kalmeron Torres, sou enfermeiro e fui aprovado e classificado em 1º lugar na EsFCEx CFO/QC 2017/2018, isso após três reprovações.

Acho que tudo começou quando cheguei para morar em Recife, Agosto de 2004. Fui morar com meu irmão na casa de estudante, lá dividíamos o quarto com mais duas pessoas e por lá morei por quatro anos. No início foi muito difícil, meu irmão já estava na faculdade e dava aulas pela manhã, e essa era nossa renda; meus pais? Bem, minha mãe tinha falecido ainda quando éramos crianças e meu pai rapidamente, já tinha uma nova família. Até hoje minha família somos meu irmão e eu.

No segundo ano tudo foi ficando mais apertado e cada vez mais difícil, por dezenas de vezes nosso café, almoço e jantar era apenas cuscuz com manteiga e café, até o ponto que, jamais vou esquecer quando em um domingo, no almoço não tínhamos absolutamente nada pra comer, precisávamos esperar até segunda para ele receber da escola, nem mesmo podíamos usar passagens do cartão para ir até a casa do nosso tio, que muito nos ajudou; então pedimos emprestado a um colega da casa um pacote de bolacha e esse foi nosso almoço, não sendo suficiente disse que ainda sentia fome e ele me pediu que deitasse pra dormir que a fome passava, foi definitivamente nosso pior momento dentro da casa; no entanto tudo iria começar a melhorar, quinze dias depois fui convidado para trabalhar em uma pequena empresa que ficava próximo à casa de estudante, chegava lá às 7h; eu e mais outra pessoa arrumávamos toda a empresa, lavávamos os banheiros diariamente e depois eu seguia paras os fundos onde a dona possuía uma pequena ONG de animais eram 32 gatos e 6 cachorros, onde fazíamos a limpeza e alguns curativos. Eu trabalhava de segunda à sexta até o meio dia, já no sábado e domingo ia apenas ver os animais, recebia R$ 250,00 e ela ainda pagava meu cursinho.

Tudo estava bem e à medida que o tempo passava ia melhorando, meu irmão já tinha terminado a faculdade e começado a trabalhar, eu além do trabalho comecei a receber uma cesta básica. Em 2007, passei no vestibular para Biologia na UFPE e Enfermagem na FUNESO/Olinda, acabei ficando na enfermagem. Agora, meu tio e minha patroa pagavam minha faculdade até que consegui tirar o Fies, mas continuava trabalhando e assim foi até o fim.
Após acabar minha formação em 2011 meu irmão já estava com a vida profissional estável e concursado. Nas minhas tentativas, e sem experiência, conseguir emprego estava cada vez mais difícil, foi quando em 2014 tentei a prova de residência que acabei sendo aprovado, mas com nota não muito boa, só tinha vaga em Petrolina/PE, inviável, não fui e continuei estudando sem saber ao certo para quê, até que meu irmão me apresentou o concurso da EsFCEx, conversamos sobre a carreira militar, sobre as possibilidades de trabalho como militar e foi aí que caí de cabeça no concurso, ele me deu todo apoio, até mesmo uma oportunidade de emprego que apareceu no Hospital da PM ele pediu que eu recusasse, e foi isso que fiz, ele assumiu tudo mais uma vez; agora só estudos.
Nesse ano foram 9 vagas onde acabei ficando acima da 300º colocação; eu basicamente não me planejei, só sabia quais matérias precisava estudar e ponto, não cheguei a ler o edital, única coisa correta que fiz foi resolver as provas anteriores e então fui para prova com essa preparação; senão me falha a memória, foram 21 acertos em gerais e 27 em específica.

Já em 2015, mudei um pouco; li o edital, separei alguns materiais, comprei alguns livros cobrados e já tinha um pequeno planejamento, no dia da prova do concurso anterior meu irmão pegou um folheto do CPE, um curso presencial de gerias aqui em Recife, onde fui bem recebido pelo Professor Eduardo. Então agora estudava específica em casa e gerais tinha aulas à noite, o que me ajudou muito a traçar o planejamento de forma correta e também estudar de forma estratégica; minha maior dificuldade era com história e português. O professor de história me deu uma grata surpresa, pois já tinha sido meu professor e sabia o quanto era bom e foi o diferencial, já de português foi quem me despertou para o “estudo estratégico”, ele sempre dizia que para estudar para concurso era diferente da escola, ou seja, você precisa aprender a estudar para passar na prova, já o conhecimento fundamentado era sua obrigação desde a escola. De gerais não comprei livros, a apostila do curso era forte, só precisei complementar em geografia, mas todo o resto me acompanhou até a aprovação.
Estudava todos os dias exceto no domingo, sempre estudei fazendo resumos (aprendo mais fazendo isso), o erro de 2015, foi não ler detalhadamente o edital e acabei estudando coisas da parte específica que não cai na prova, deixando coisas mais importantes de fora. Nesse ano foram 15 vagas, no final acabei na 48ª colocação, com 23 acertos em gerais e 29 em específica.
Após a prova percebi que estava perto, mas precisava me concentrar, me acalmar na hora da prova e confiar nas minhas decisões na hora de marcar a questão. Meu irmão nunca deixou de acreditar, mais uma vez me deu força, nessa altura já pude contar com alguns amigos que também me ajudaram financeiramente, só que ainda assim ficava constrangido, então cancelei tudo o que era de cartão, limitei toda minha vida social e, não vou entrar em detalhes, mas, mais um vez o ano de 2016 foi um ano muito difícil financeiramente então mesmo tendo a oportunidade de fazer o cursinho de gerias preferi recusar para não dar mais despesas.
Em 2016 decidi que seria o ano da aprovação, então foi o ano que mais estudei. Janeiro inteiro foi de planejamento: esquematizei o edital de específica, baixei várias provas tanto de específica como gerais, fiz o planejamento do que precisava ver durante a semana e o que precisava acabar a cada mês e assim comprei mais alguns livros. Tive ajuda de um amigo que conseguiu material de gerais e fora isso continuei com a apostila do CPE para gerais.

Estudava específica durante as manhãs, as tardes eram das gerais e as noites das específicas e exercícios. Já os sábados pela manhã destinava só para as questões de gerais. Meu ciclo era leitura-resumo-exercícios, nesse ano cheguei a resumir à mão três livros, todo o assunto de saúde do idoso, saúde mental, saúde pública e alguns manuais do MS. Eu estava pilhado, estudava 10, 11h diariamente; muitas vezes ia deitar com a mão doendo de tanto escrever, outras vezes por conta do atrito com o papel precisei por curativo no dedo. Chamavam-me pra sair, ir ao cinema ou mesmo comer fora, só que eu estava paranóico, até conseguia sair, mas me sentia culpado e cá entre nós um pouco humilhado por ter tudo pago, passeios, algumas viagens, então era difícil, eu só queria estar no quarto estudando.  Então foi um ano insano, positivo porque estudei muito, mas negativo porque estava meio que doente, estressado, chegava a agredir verbalmente as pessoas que me apoiavam, tinha pesadelos constantes com a prova, fora os pesadelos que acumulava do passado; alguns familiares com desdém sobre não trabalhar e etc…

Em agosto, voltei para o CPE para fazer a revisão e então poder fixar pontos chaves da prova já que o foco da revisão eram questões; engraçado que lá me sentia bem, porque todos estavam no mesmo barco para o mesmo objetivo, acho que esse é o grande lance de poder fazer um cursinho, você pode estar com as pessoas que falam a mesma língua.
Na noite anterior a prova eu ainda estava mergulhado nos meus resumos e esquemas; no dia da prova ainda levei um bloquinho de anotações e fiquei revisando até o permitido. Na hora da prova estava ofegante e tremulo, mesmo assim, no momento que foi permitido já iniciei respondendo, comecei por gerais, faltando 1h para o final da prova já tinha respondido, revisado e marcado no cartão.
Saí da prova confiante, mas não sabia se seria o suficiente. Pois bem, quando eu vi o gabarito vi que não iria conseguir, gerais continuava bem, mas em específica tinha feito apenas 30 acertos, sabia que não iria dar. Segurei o choro e fui caminhar me sentido um lixo, tudo perdido; depois sentei e foi quando meu irmão me ligou pra saber do gabarito, conversamos, ele só pediu para não desistir; meus amigos também conversaram comigo.

Enfim, quando saiu o resultado, meu irmão disse que mesmo estudando muito eu tinha muitas chances de não passar porque eu estava não fazendo a prova para mim, mas para os outros, esperando a aprovação da família; que eu tinha o conhecimento para aprovação, mas não tinha o espírito do aprovado.
E assim, fechei meu concurso de 2016, das 6 vagas fiquei na majoração na 15º colocação.

Eu até brincava quando estava em público, com os amigos, mas sozinho me culpava e pedia muito perdão primeiro a Deus e segundo a minha vó e a minha mãe pelas grosserias e todas as outras escolhas erradas. Além disso, agradecia por ter apoio, saúde para continuar e forças para não desistir, e pedi muita paz de espírito para esquecer um pouco do passado, pensar nas pessoas que me queriam bem, pensar no meu presente.
Entrei em janeiro de 2017 decidido a agir mais levemente; meu método de estudo permaneceu, só mudei pequenas coisas, mas meu modo de agir mudou. Com tudo esquematizado mais uma vez, com material necessário, consegui estudar 90% do edital apenas por resumos. Nesse ano tinham muitos boatos que não haveria vagas para enfermagem, então até sair o edital só estudei as específicas e português.
E aí coloquei 100% em prática o que tinha ouvido do professor em 2015, estudar para passar na prova. Foquei forte nos exercícios, eu não contava horas, contava questões, exemplo: determinava fazer 50 questões independentemente do tempo que levaria. Inventei uma “semaninha”, que consistia em pequenos assuntos que precisava revisar diariamente antes de iniciar os estudos. Para cada dia da semana tinha um bloquinho de assunto composto por assuntos de específicas e gerais. Via repetidamente, só mudava no mês seguinte. E então estudei estrategicamente: foco em geografia e história, ou seja, conseguir entre 13 à 15 pontos nelas e o restante ver de português e espanhol.

 

Como tinha muita coisa resumida, então pude ver o mesmo assunto diversas vezes. Na parte de gerais, em português foquei no que tinha segurança, não cheguei nem perto do Bechara, comprei um livro de questões e teoria e a apostila foram meus únicos referenciais, então foco total em assuntos específicos, exemplo: crase, figuras de linguagem que tinham altas chances de estar na prova, eu precisava firmar bem o conhecimento, muita coisa vi rapidamente já que não só era fraco como não tinha tradição de cair na prova.
De história, embora tivesse muita segurança na apostila do CPE – eu particularmente gostei tanto que nesses anos ela acabou se tornando um grande borrão de tanto que li e risquei – também comprei o Boris, pois não tinha outra referência além da apostila. Nele, meu foco foi colônia até governo de Goulart, da internet eu achei e consegui baixar centenas de exercícios desses assuntos.
De geografia eu usei apenas o Eustáquio – três volumes e o Lygia Terra – volume único (este não consta na bibliografia), dessa parte tive ajuda de uma amigo que é professor de geografia, então tive muito material.

Optei por espanhol, esse deixei para ver no último mês, estudei apenas por Youtube, fiz um “resumão” e estudei repetidamente.
Se fosse resumir tudo seria: estudos de resumo/revisão + exercícios; cheguei a procurar um curso para fazer revisão, mas no final, já não tinha tanta coragem de pedir, então preferi finalizar por conta própria, fiz uma lista de apostas que poderia estar na prova e estudei apenas o que tinha nessa lista e deu certo.
Nesse ano embora tenha estudado muito, foi mais leve, me diverti, saindo bem mais que o ano anterior e procurava não sofrer tanto com isso; quando estava cansado ou não queria, apenas não estudava. Em junho passei por mudança de endereço e reforma na nova casa e passei quase 40 dias sem pegar nos estudos, cheguei até pensar que esse ano não daria, tanto pela baixa quantidade de vagas como não teria estudado como no ano anterior, mas na verdade, eu estava ficando menos estressado. O conhecimento acumulado não iria se perder.
No dia anterior a prova, fui para o cinema, fiquei com meus amigos e a família do meu irmão, quando já estava para ir dormir meu irmão me ligou dizendo que preferiu não falar isso na frente dos outros, mas pediu que eu não tentasse provar nada para ninguém, nem mesmo para mim, a prova seria só um detalhe para algo maior. Que eu pensasse nas pessoas que me amam, pensar o quanto Deus sempre esteve do nosso lado, como nossa mãe e vó sempre estiveram ao nosso lado. Sabe, foi um conforto.
Então fui fazer a prova, na hora, ainda estava nervoso, tremia como sempre, no entanto na hora de iniciar, eu fiquei folheando a prova, via uma questão aqui, outra ali, só me acalmando e conhecendo a prova, e então comecei pela parte específica. Saí da prova sem ter muita certeza da aprovação, mas estava tranquilo, quando fui ver o gabarito minha estratégia tinha dado certo: História 8 acertos, Geografia 7 acertos, Português 5 e Espanhol 5. Faltavam só as específicas. Ouvi e vi alguns comentários de específica, e dos comentários eu errava sempre, mas para minha surpresa foram as únicas que errei, consegui 35 acertos. E tudo deu certo, finalmente, chegou minha vez. Das duas vagas uma era minha, a primeira, assim como a primeira vez que via meu nome como destaque em algo grande.
Sei que a história foi longa, mas só tentei dizer que todas às vezes que me perguntam o que não me fazia desistir, como eu tinha tanta disciplina e etc …, é tentar mostrar que todo mundo tem dificuldades e isso é inevitável, o que muda é a maneira que reagimos a isso.
Honestamente, digo que se ainda não chegasse a concluir o curso e me tornar Tenente, posso dizer de coração aberto que estou aliviado, estou em paz e como tudo passou rápido e como tudo valeu a pena.

 

Pra você que está tentando, não existe uma receita para aprovação, existe apenas o quanto você consegue resistir à queda e ainda sim continuar buscando o melhor, seja dentro ou fora da escola.

Coragem, todos nós podemos!

Obrigado e que Deus os abençoe!!!

Depoimento de Kalmeron Tores

– 1º Colocado no concurso EsFCEx – Enfermagem

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